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17/08/2016

Não Há Plano B

Com os recursos consumidos mais rapidamente a cada ano, o planeta só se salvará do esgotamento por meio de uma mudança no estilo de vida e na lógica do consumo


Não faltam alertas sobre os impactos dos meios de
 produção e de consumo nos ecossistemas do planeta
  
A questão é relativamente simples: ou nos damos conta de que o planeta é um só e os recursos são finitos, ou estaremos determinando o mais sombrio cenário – ainda neste século – para nós mesmos e para aqueles que vierem depois. Parece um alerta terrorista, mas o diagnóstico é dos cientistas. Sucessivos relatórios do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma), do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), do Worldwatch Institute, entre tantas outras organizações reconhecidamente sérias e prestigiadas na comunidade científica, denunciam os impactos vorazes dos atuais meios de produção e de consumo sobre os ecossistemas planetários. É como se dá quando um parasita vai drenando lenta e progressivamente os elementos vitais do hospedeiro. Enfraquecida, a Terra já dá sinais de desgaste. Em 19 de agosto do ano passado, alcançamos mais cedo o Earth Overshoot Day (Dia Mundial da Sobrecarga), quando se descobriu que em apenas oito meses consumimos todos os recursos previstos para abastecer a humanidade ao longo de um ano inteiro. De acordo com a organização Global Footprint Network, que realiza o cálculo ano a ano, desde 2000 a data vem chegando perigosamente mais cedo: de 1º de outubro em 2000 a 19 de agosto em 2014. Se o planeta fosse uma empresa, estaria literalmente no vermelho, em regime pré-falimentar.
A menor parcela da humanidade – notadamente a minoria mais abastada – é responsável pelos impactos mais devastadores. “Os 65 países com maior renda, em que o consumismo é dominante, foram responsáveis por 78% dos gastos mundiais em bens e serviços, mas contam com apenas 16% da população mundial. Somente os americanos, com 5% da população mundial, ficaram com uma fatia de 32% do consumo global. Se todos vivessem como os americanos, o planeta só comportaria uma população de 1,4 bilhão de pessoas”, denunciou em um de seus relatórios o Worldwatch Institute.
A solução é desarmar a bomba-relógio do hiperconsumo, não mais associando a acumulação de bens e posses como indicadores de realização pessoal e felicidade. Isso começa dentro de casa, passa pela escola, universidade e mercado de trabalho. Ser feliz com menos não é apenas possível, é absolutamente necessário. Uma nova cultura, onde o consumismo só seja bem-vindo quando aludir a acúmulo de conhecimento, lazer, entretenimento, mais tempo para a família e os amigos. Um estilo de vida mais simples, no qual ostentar a abundância seja algo cada vez mais digno de piedade.
É preciso também acelerar os mecanismos que tornam obrigatórias a rastreabilidade (origem) e a selagem (certificação) dos produtos e serviços. Ampliar o entendimento do consumo como um ato político, com impactos diretos sobre o planeta e a qualidade de vida das pessoas que vivem nele. Privilegiar as marcas éticas e discriminar aquelas que não promovem a sustentabilidade em suas rotinas.
Consumo consciente é o norte magnético da bússola que deve orientar o aparecimento de uma nova cultura menos egoísta e mais igualitária, com menos “eu” e mais “nós”. Precisamos deixar de ser passageiros para assumir a condição de tripulantes dessa nave azul, assumindo a responsabilidade pelo legado que deixaremos após a nossa passagem por aqui. A boa notícia é que dispomos de todas as informações, de todo o conhecimento, de todas as tecnologias necessárias para virar esse jogo. Não é o planeta que precisa de ajuda. Somos nós.

Artigo extraído na íntegra do caderno "Consumo Consciente" da Editora Globo e de autoria do Jornalista André Trigueiro. Disponível em (http://app.cadernosglobo.com.br/volume-07/consumo.html#artigo-08).

ANDRÉ TRIGUEIRO é jornalista especializado em ecologia e sustentabilidade. É editor-chefe do programa Cidades e soluções, da GloboNews, comentarista da rádio CBN, articulista do G1 e repórter da TV Globo. É professor de Jornalismo Ambiental na PUC/Rio e Geopolítica Ambiental na Coppe/UFRJ. É autor de vários livros, entre eles Mundo sustentável (editora Globo, 2005 e 2012) e Espiritismo e ecologia (Federação Espírita Brasileira, 2009).



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